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terça-feira, 17 de novembro de 2009

Sorry Day II - Forgotten Australians

A Austrália é um país sensacional, maravilhoso, mas tem alguns capítulos absolutamente assustadores na história.



Um deles diz respeito aos forgotten Australians, crianças e adolescentes australianas que entre as décadas de 20 e 70 foram, literalmente, raptadas nas ruas e mandadas para orfanatos do governo que mais pareciam colônias penais comandadas por "religiosos". Não preciso dizer que sofreram todo tipo de abuso.

Cerca de 500 mil crianças foram raptadas. Muitas tinham família, mas passaram a acreditar que eram órfãos. Elas receberam a companhia de mais de 130 mil crianças inglesas, brancas, que foram enviadas para a Austrália para, digamos, espalhar um pouco do DNA branco.



The Leaving of Liverpool é uma excelente minisérie produzida para a TV sobre esses ingleses. O DVD pode ser encontrado na biblioteca de Waverley, em Bondi Junction, e neste link há uma cena bem emblemática.

Mas ontem, Kevin Rudd, nosso primeiro-ministro, pediu desculpas para todas as pessoas e famílias que de alguma forma passaram e sofreram com a política adotada por mais de meio século.



Esse foi o segundo pedido de desculpas oficial de Rudd, desde que assumiu o governo, há quase dois anos.

O primeiro aconteceu em fevereiro de 2008, quando se desculpou às chamadas "gerações roubadas", como podem ver neste post.

É claro que um sorry não resolve muita coisa, mas pode ser um começo. Só o fato do governo reconhecer o problema e se desculpar, já demonstra certa pré-disposição, além de grandeza. Entre os presentes à cerimônia, centenas de vítimas, incluindo Steve Fielding, um dos forgotten Australians, hoje senador.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Schindler, Droverine, Wolverine e um desempregado



E não é que a Lista de Schindler (aquela mesmo, que o Spielberg filmou em 1993) apareceu em uma bilioteca de Sydney esta semana. Com 13 páginas amareladas e 801 nomes e nacionalidades de judeus datilografadas, ela estava no meio de várias notas de pesquisas e recortes de jornais alemães pertencentes ao escritor australiano Thomas Keneally, o autor do livro A Arca de Schindler, que deu origem ao filme. A biblioteca comprou o material em 1996 e não fazia a menor idéia que a lista estava lá.

Falando em cinema e Austrália, parece que eu fui uma das poucas pessoas no planeta que gostou do filme Australia. Não sei se pelo fato de eu ser um entusiasta (leia-se entusiaaaasta) do país e da cultura aborígene, ou por ter assistido sem muita expectativa, mas o fato é que pra mim, um romance filmado num lugar espetacular, cheio de bêbados locais e com pitadas mágicas do Oz, no caso, da Ozzyland, através dos silvícolas locais, funcionou.



Sem contar na atuação do Droverine. Encarnando o típico australiano do interior, o ator Hugh Jackman está bem engraçado no papel do “ogro-cowboy” Drover. Já a minha ex-musa Nicole Kidman decepcionou. Não pelo papel de lady inglesa, mas pela quantidade de botox colocada no lábio. Tratando-se do deserto australiano, a impressão é que ela foi picada pela temível abelha gigante do Outback.



E falando no Droverine, quinta-feira passada o colunista da FoxNews.com Roger Friedman quis dar uma de fanfarão da 25 de março (na verdade, de Chinatown), e escreveu em sua coluna que baixar o filme X-Men Origins: Wolverine foi bem mais fácil do que sair para vê-lo na chuva. O filme, segundo a 20th Century Fox, ainda nem havia sido finalizado (na Austrália só estréia em 29 de abril), e o pirateiro, que escrevia há 10 anos para o site e fez a crítica em cima de uma "cópia" ilegal, foi demitido.



Detalhe: 20th Century Fox e FoxNews.com são propriedades do mesmo dono, o magnata australiano Rupert Murdoch, o dono da News Corp, e sogro da Sarah Murdoch (esta sim, atual musa que volta e meia vem correr aqui em Bronte, onde tem uma mansãozinha de frente para a praia).


É a gata da direita, de cinza.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Papelão jornalístico à vista

Este caso tem tudo para virar objeto de estudo em 10 entre 10 faculdades de jornalismo em todo o mundo. Por aqui, editor deve perder a cabeça - e talvez vá em cana - assim como jornal grande deve perder credibilidade e milhões de dólares. Tudo por conta de algumas fotos de uma parlamentar seminua que, na verdade, não era ela (entenderam? Tipo novela mexicana – ops, australiana).



Pauline Hanson, ex-vendedora de fish n´ chips, é uma polêmica parlamentar que está em campanha no estado de Queensland. Conhecida por suas posições radicais (sem trocadilho) em relação a questões como imigração (ela é contra) e aborígenes (ela odeia os silvícolas), Hanson volta e meia está metida em encrenca.

A última foi no final de semana passado, quando o jornal The Sunday Telegraph publicou supostas fotos dela seminua, tiradas no início da década de 1970 por um ex-namorado, quando Pauline tinha 19 anos. A repercussão foi imediata, não só aqui como na Nova Zelândia, na Inglaterra e em países asiáticos outrora atacados por ela como Singapura.



Porém, na quarta-feira, o jornal concorrente The Sydney Morning Herald divulgou o parecer de um renomado perito em anatomia que analisou as fotos publicadas e as fotos dela da época.

A boa notícia para o jornal é que as chapas não foram alteradas em Photoshop ou em algum outro programa de computador. Já a má notícia é o fato de não se tratar da mesma pessoa. Segundo Meiya Sutisno, o perito, o pescoço muito curto e o nariz estreito são as principais diferenças.

Polêmicas e processos à vista. A mídia agradece!

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Sorry Day e a maldição da múmia (ou seria do múmio?)



Quarta-feira passada, 13 de fevereiro, Kevin Rudd, nosso primeiro-ministro, pediu desculpas ao povo aborígene pelos abusos cometidos desde a chegada do intrépido Captain Cook, em 1770, principalmente em relação à chamada “geração roubada” (veja filme homônimo do diretor Phillip Noyce – Rabbit-Proof Fence, em inglês), ocorrida nas primeiras décadas do século XX.



O australiano médio, que torce o nariz para os aborígenes, não gostou muito do pedido de desculpas, que entrou para a história como Sorry Day. Mas ele também não morre de amores pelos japoneses, coreanos, chineses, indianos, libaneses, enfim, parte da população é de fato preconceituosa, assim como acontece em praticamente todos os cantos do planeta.


Eu assisti à cerimônia e me emocionei. Num mundo sem muita esperança como o nosso, cuja figura mais poderosa atende pelo nome de Georg W. Busha, ver um homem branco, comandante de uma economia que movimenta cerca de US$ 700 bilhões por ano, tomar uma atitude como esta, é, no mínimo, confortante.



Claro, sou suspeito pra falar. Na contra-capa do meu livro é citado o povo aborígene (“nativos da Oceania” – http://www.livropablonacer.blogspot.com/), viajei 3 vezes para uma aldeia indígena xavante no Mato Grosso, fui adotado por um clã, batizado e devo muito a eles. Mas acredito que tantas outras milhões de pessoas que não necessariamente tenham alguma ligação com os povos nativos, também se emocionaram com o Sorry Day.



E falando nos primeiros a chegarem, terminou esta semana no National Maritime Museum (em Darling Harbour – Sydney), a exposição Iceman – the story of Ötzi, sobre o nosso irmão mais velho. Encontrado nos Alpes, entre a Itália e a Áustria, em 1991, o finado, delgado e congelado Ötzi é a múmia mais antiga do mundo (por que não múmio?). Ele estava no gelo há 5.300 anos e foi descoberto acidentalmente por turistas.



Além de fotos impressionantes da múmia, a exposição também trazia uma réplica em tamanho real do corpo e de como ele devia ser (barba, cor do cabelo etc), peças e objetos que reproduziam a vida do glorioso Ötzi e as possíveis causas de sua morte (em off: mataram o homem). Muito interessante! Se a exposição for para a sua cidade, não perca. Afinal, o cara não ficou 5.300 anos pelado no gelo para ser ignorado (não é à toa que existe a tal da maldição da múmia - ou seria do múmio?).

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Australia Day – A origem do porre cívico

Sábado passado (26 de janeiro aqui, 25 de janeiro no Brasil), enquanto o meu coração vermelho, branco e preto comemorava os 554 anos da fundação de São Paulo, o meu lado súdito da rainha celebrava o Australia Day, o feriado mais importante destas bandas. Mas o que é o Australia Day?



Podemos dividir o brasileiro que vive na Austrália em 4 grupos: os que acham que o Australia Day é o Dia da Independência australiana (o nosso 7 de setembro); os que acham que o Australia Day é o Dia da Proclamação da República (nosso 15 de novembro); os que acham que o Australia Day é o Dia do Descobrimento (nosso 21 de abril); e os que não acham absolutamente nada. Os que não acham absolutamente nada são os que mais se aproximam da resposta correta, uma vez que no dia 26 de janeiro a Austrália não foi descoberta, não proclamou a república e muito menos declarou a independência.

No referido dia, o australiano se veste de verde e amarelo, pinta a bandeira no corpo inteiro e sai às ruas para tomar a maior quantidade possível de cerveja com o intuito de celebrar o desembarque do glorioso Capitão Arthur Phillip em Port Jackson (New South Wales), ocorrido em 26 de janeiro de 1788. Com ele, vieram da Inglaterra a primeira leva de prisioneiros, oficiais e demais tripulantes para iniciar a colonização na Austrália, à época a mais nova colônia penal britânica de férias. No total chegaram 1373 pessoas, entre homens, mulheres, crianças e namorados de flatmates (detesto namorados de flatmates).



Sim! Os primeiros não-aborígenes que nasceram em solo australiano – também conhecidos como australianos – provavelmente eram filhos de ex-prisioneiros britânicos. Já contei essa história no meu outro site, mas como o blog é meu e ninguém tem nada a ver com isso, recontarei sob a mesma forma de conto de fadas:

Há dois séculos, num velho continente distante, havia uma ilha muito muito grande. Dentre outros tesouros, lá se produziam verdadeiros patrimônios da Humanidade como o whiskie escocês e a indescritível cerveja Guiness. Mesmo vivendo com tamanha fartura e (tecnicamente) felizes para sempre, alguns moradores tentaram facilitar ainda mais as coisas se apropriando indevidamente do que não lhes pertencia. Sem escolha, George III, o rei, colocou-os nos calabouços reais.

George III por Allan Ramsay, 1762

Enquanto isso, na bela e ensolarada manhã do dia 8 de agosto de 1768, o capitão inglês James Cook deixou o porto de Plymouth em seu navio Endeavour e seguiu viagem. Ele desceu pela Ilha da Madeira, passou pela costa oeste africana e atravessou o Atlântico rumo à América do Sul, onde fez uma estratégica parada no Rio de Janeiro em 13 de novembro de 1768. Após um eletrizante Fla-Flu e uma noitada no Morro da Mangueira, Cap. Cook foi para o Pacífico Sul, permaneceu três meses no Taiti observando o planeta Vênus, seguiu para a Nova Zelândia, onde interagiu com a fascinante população maori, até que finalmente aportou na Austrália na bela e ensolarada manhã do dia 19 de abril de 1770.

Capitain Cook por Nathaniel Dance, 1775

Entre um pente e um espelho que distribuiu para os aborígenes, C.C. (Captain Cook) enviou – via Sedex – uma carta para Georginho III contando-lhe sobre as últimas na recém-descoberta terra (na verdade, a China já havia decoberto a Austrália – e quase todo o novo mundo – havia 350 anos, mas isso é assunto para outro texto).

Entusiasmado com o que lera, o visionário monarca, que enfrentava grave problema com a superlotação carcerária, “propôs” aos prisioneiros uma certa “anistia”, caso eles aceitassem viajar alguns poucos quilômetros a sudoeste. Alegres com a bondade real, os detentos embarcaram aos montes e vieram, sob o comando do Capitão Arthur Phillip para a Austrália reiniciar a vida na nova colônia penal (é importante lembrar que os Estados Unidos já eram colônia penal da Coroa Britânica).


Arthur Phillip por Francis Wheatley, 1786

E assim, após 8 meses de viagem com direito a nova parada estratégica no Rio de Janeiro, Arthur Phillip e toda a turma aportaram inicialmente em Botany Bay, em 18 de janeiro, desembarcando definitivamente em Port Jackson, em 26 de janeiro. Trinta anos depois, em 1818, o Governador Lachlan Macquarie realizou a primeira celebração oficial do desembarque que, com o passar do tempo, recebeu diferentes graças como Foundation Day, Anniversary Day, Survival Day e Invasion Day (cortesia dos aborígenes), sendo hoje chamado nacionalmente de Australia Day, o pretexto número 1 para um grande porre cívico.



Algo a ver com o Invasion Day?