Matéria publicada na edição 7 da Radar Magazine, na Austrália.
Se ainda é difícil definir e dar uma cara à culinária brasileira, identificar a origem através das principais influências é uma tarefa menos complicada. Na verdade, é uma aula de história. Nasce com os nativos indígenas, passa pela chegada dos colonizadores portugueses e segue com os escravos negros levados da África. Um prato que traduz bem estes primeiros séculos do Brasil colonial é a moqueca – seja ela baiana ou capixaba – as duas mais tradicionais.
O nome vem de moquém, moquear, que era o modo como os índios assavam peixes e caças. Ainda dos indígenas vieram a mandioca utilizada para fazer o pirão, o mais famoso dos acompanhamentos, e no caso da moqueca capixaba o azeite de urucum. De assados os ingredientes passaram a ser cozidos, técnica introduzida pelos portugueses, que também levaram a cebola e o alho. Já os negros apresentaram o azeite de dendê e o leite de coco, ingredientes indispensáveis na moqueca baiana.
Mas afinal, qual é a melhor, a baiana ou a capixaba? Para tentar responder, realizamos o I Desafio das Moquecas em território australiano. De um lado, Julia Braga, natural de Salvador, gerente comercial e sócia da Radar Magazine. Do outro, Gel Freire, natural de Vitória, presidente do Sydney Brazilian Social Club (Canarinhos). O desafio: fazer uma moqueca com os peixes daqui, mas bem ao estilo de cada estado.
A primeira a ser testada foi a baiana. Julia optou pela moqueca de camarão e, como não poderia ser diferente, não abriu mão do azeite de dendê, do leite de coco e dos pimentões verdes, três ingredientes que não entram na capixaba. O ideal é sempre cozinhar em panelas de barro, mas como um dos objetivos desta matéria é possibilitar que os leitores façam em casa, Julia cozinhou em panela normal.
Para a capixaba, Gel levou o óleo de urucum e cinco panelas de barro (quatro pequenas e uma grande) produzidas artesanalmente pelas famosas paneleiras de Goiabeiras. As menores eram para o camarão, enquanto a maior para o peixe. Por aqui, o snapper e o kingfish são os melhores peixes para fazer moqueca, pois são firmes e não possuem tanta espinha. No Brasil, os mais utilizados são o badejo, o namorado e o robalo. Já os melhores camarões são o king e o banana.
A execução de ambas é simples e não leva muito tempo. A capixaba demorou um pouco mais porque Gel, além de ter optado por camarão e peixe, também preparou um pirão. Julia fez arroz para acompanhar. Outro tradicional acompanhamento é a farofa de banana-da-terra. As duas moquecas estavam deliciosas. A baiana é mais encorpada, substanciosa, pois traz a doçura do leite de coco com a untuosidade do dendê. Já a capixaba é menos intensa, mais leve e um pouco mais aromática, por conta da cebolinha e da salsinha, que não entram na baiana, e também pela combinação do coentro com o limão, que é muito marcante.
E a vencedora foi...
Bem, isso depende do paladar de cada um. O importante é que as receitas estão nas páginas da Radar Magazine, cada uma com o seu sotaque próprio, ambas bem brasileiras e fáceis de serem feitas – mesmo a milhas de distância de Vitória e Salvador.